Licitações e Contratos: Orientações e Jurisprudência do TCU Licitações e Contratos

5.11. Formalização do contrato

Os contratos administrativos são aqueles firmados entre órgãos ou entidades da Administração Pública e particulares, por meio do qual se estabelece acordo de vontades, para a formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas[1].

Diversamente dos contratos firmados entre particulares, no âmbito do direito privado, os contratos administrativos têm o objetivo principal de atender a um interesse coletivo e, portanto, conferem à Administração algumas prerrogativas, denominadas cláusulas exorbitantes, justificadas pelo princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, as quais permitem ao contratante, por exemplo, modificar ou extinguir unilateralmente o contrato, fiscalizar a sua execução e impor sanções ao particular[2].

Os contratos administrativos regidos pela Lei 14.133/2021 regulam-se pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público. Supletivamente, poderão ser aplicados os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado[3].

É necessário que o instrumento contratual estabeleça, de forma clara e precisa, as condições para a execução do objeto, definindo os direitos, as obrigações e as responsabilidades das partes, em conformidade com os termos do edital de licitação e os da proposta vencedora. Em caso de contratação direta, devem ser observados os termos do ato que a autorizou e os da proposta apresentada pelo particular contratado[4].

O instrumento de contrato é, em regra, obrigatório, mas poderá ser substituído por outro instrumento hábil, como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço, nos casos de[5]:

  1. dispensa de licitação em razão de valor (hipóteses descritas no art. 75, incisos I e II, da Lei 14.133/2021).  Sobre essa questão, é relevante mencionar a Orientação Normativa – AGU 84/2024, a qual entende ser admissível a substituição do instrumento contratual por outro mais simplificado sempre que o valor dos contratos se enquadrar ao valor atualizado que autoriza a dispensa de licitação, independentemente se a contratação resultou de licitação, inexigibilidade ou dispensa;
  2. compras com entrega imediata (consideradas como aquelas com prazo de entrega de até trinta dias da ordem de fornecimento[6]) e integral dos bens adquiridos, e dos quais não resultem obrigações futuras, inclusive quanto a assistência técnica. A aplicabilidade dessa hipótese independe do valor da compra.

Na hipótese de substituição do instrumento de contrato, será aplicável, no que couber, o disposto no art. 92 da Lei 14.133/2021[7]. O Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos em Serviços Públicos (MGI) e a Advocacia-Geral da União (AGU) orientam as organizações do Poder Executivo Federal a estabelecer as condições da contratação no edital ou, em caso de contratação direta, no termo de referência[8].

Os contratos deverão ter forma escrita, admitida a forma eletrônica[9]. Assim, não é permitido o contrato verbal com a Administração, sob pena de ser declarado nulo e de nenhum efeito, salvo em hipóteses de pequenas compras ou de prestação de serviços de pronto pagamento[10], assim entendidos aqueles de valor não superior a R$ 11.981,20[11].

Contratos relativos a direitos reais sobre imóveis deverão ser formalizados por escritura pública lavrada em notas de tabelião, cujo teor deverá ser divulgado e mantido à disposição do público em sítio eletrônico oficial[12].

É importante mencionar que, se um contrato administrativo foi originado de uma licitação ou contratação direta regida pelas leis 8.666/1993, 10.520/2002 ou 12.462/2011, ele continuará sendo regido pelas regras previstas nessas leis durante toda a sua vigência. Isso significa que as disposições dessas leis continuarão a ser aplicadas ao contrato, mesmo após revogadas[13].

Por fim, vale lembrar que a Lei 14.133/2021 determina que, sempre que o objeto permitir, a Administração deve adotar minutas padronizadas de edital e contrato com cláusulas uniformes[14]. Para tanto, os órgãos da Administração com competências regulamentares relativas às atividades de administração de materiais, obras, serviços, licitações e contratos devem instituir modelos de minutas de editais, termos de referência, contratos padronizados e outros documentos. A não utilização dos modelos de minutas deve ser justificada por escrito e anexada ao respectivo processo licitatório[15].

Quadro 366 – Referências normativas para a formalização do contrato administrativo

NormativosDispositivos
Lei 14.133/2021Art. 19. Os órgãos da Administração com competências regulamentares relativas às atividades de administração de materiais, de obras e serviços e de licitações e contratos deverão: […] IV – instituir, com auxílio dos órgãos de assessoramento jurídico e de controle interno, modelos de minutas de editais, de termos de referência, de contratos padronizados e de outros documentos, admitida a adoção das minutas do Poder Executivo federal por todos os entes federativos; […] § 2º A não utilização do catálogo eletrônico de padronização de que trata o inciso II do caput ou dos modelos de minutas de que trata o inciso IV do caput deste artigo deverá ser justificada por escrito e anexada ao respectivo processo licitatório. […] Art. 89. Os contratos de que trata esta Lei regular-se-ão pelas suas cláusulas e pelos preceitos de direito público, e a eles serão aplicados, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito privado. […] § 2º Os contratos deverão estabelecer com clareza e precisão as condições para sua execução, expressas em cláusulas que definam os direitos, as obrigações e as responsabilidades das partes, em conformidade com os termos do edital de licitação e os da proposta vencedora ou com os termos do ato que autorizou a contratação direta e os da respectiva proposta. […] Art. 91. Os contratos e seus aditamentos terão forma escrita e serão juntados ao processo que tiver dado origem à contratação, divulgados e mantidos à disposição do público em sítio eletrônico oficial. […] § 2º Contratos relativos a direitos reais sobre imóveis serão formalizados por escritura pública lavrada em notas de tabelião, cujo teor deverá ser divulgado e mantido à disposição do público em sítio eletrônico oficial. § 3º Será admitida a forma eletrônica na celebração de contratos e de termos aditivos, atendidas as exigências previstas em regulamento. […] Art. 95. O instrumento de contrato é obrigatório, salvo nas seguintes hipóteses, em que a Administração poderá substituí-lo por outro instrumento hábil, como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço: I – dispensa de licitação em razão de valor; II – compras com entrega imediata e integral dos bens adquiridos e dos quais não resultem obrigações futuras, inclusive quanto a assistência técnica, independentemente de seu valor. § 1º Às hipóteses de substituição do instrumento de contrato, aplica-se, no que couber, o disposto no art. 92 desta Lei. § 2º É nulo e de nenhum efeito o contrato verbal com a Administração, salvo o de pequenas compras ou o de prestação de serviços de pronto pagamento, assim entendidos aqueles de valor não superior a R$ 10.000,00 (dez mil reais). (Vide Decreto nº 10.922, de 2021) (Vigência) (Vide Decreto nº 11.317, de 2022) Vigência […] Art. 104. O regime jurídico dos contratos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, as prerrogativas de: I – modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado; II – extingui-los, unilateralmente, nos casos especificados nesta Lei; III – fiscalizar sua execução; IV – aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste; V – ocupar provisoriamente bens móveis e imóveis e utilizar pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato nas hipóteses de: a) risco à prestação de serviços essenciais; b) necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, inclusive após extinção do contrato. […] Art. 191. Até o decurso do prazo de que trata o inciso II do caput do art. 193, a Administração poderá optar por licitar ou contratar diretamente de acordo com esta Lei ou de acordo com as leis citadas no referido inciso, e a opção escolhida deverá ser indicada expressamente no edital ou no aviso ou instrumento de contratação direta, vedada a aplicação combinada desta Lei com as citadas no referido inciso. Parágrafo único. Na hipótese do caput deste artigo, se a Administração optar por licitar de acordo com as leis citadas no inciso II do caput do art. 193 desta Lei, o contrato respectivo será regido pelas regras nelas previstas durante toda a sua vigência.
Orientação Normativa – AGU 84/2024I – É possível a substituição do instrumento de contrato a que alude o art. 92 da Lei nº 14.133, de 2021, por outro instrumento mais simples, com base no art. 95, inciso I, do mesmo diploma legal, sempre que: a) o valor de contratos relativos a obras, serviços de engenharia e de manutenção de veículos automotores se encaixe no valor atualizado autorizativo da dispensa de licitação prevista no inciso I do art. 75, da Lei nº 14.133, de 2021; ou b) o valor de contratos relativos a compras e serviços em geral se encaixe no valor atualizado que autoriza a dispensa de licitação prevista no inciso II do art. 75, da Lei nº 14.133, de 2021. II – Não importa para a aplicação do inciso I do art. 95, da Lei nº 14.133, de 2021, se a contratação resultou de licitação, inexigibilidade ou dispensa.
Enunciado – CJF 26/2023O instrumento de contrato poderá ser substituído por outro instrumento hábil na hipótese de contratação cujo valor não ultrapasse os limites estabelecidos para a dispensa de licitação (art. 75 da Lei n. 14.133/2021), inclusive nas inexigibilidades.

Fonte: Elaboração própria com base nas normas consultadas.

Quadro 367 – Jurisprudência do TCU

AcórdãosDispositivos
Acórdão 9277/2021-TCU-Segunda Câmara[Enunciado] A formalização de contratação de fornecimento de bens para entrega imediata e integral (art. 62, § 4º, da Lei 8.666/1993) não pode ser realizada por meio de nota de empenho quando forem necessários serviços de garantia e de suporte técnico, que caracterizam obrigação futura para o contratado.
Acórdão 9749/2020-TCU-Plenário[Enunciado] A continuidade da execução de serviços após esgotado o prazo de vigência contratual caracteriza contratação verbal, situação vedada pelo art. 60, parágrafo único, da Lei 8.666/1993.
Acórdão 1234/2018-TCU-Plenário[Enunciado] É possível a formalização de contratação de fornecimento de bens para entrega imediata e integral, da qual não resulte obrigações futuras, por meio de nota de empenho, independentemente do valor ou da modalidade licitatória adotada, nos termos do art. 62, § 4º, da Lei 8.666/1993 e à luz dos princípios da eficiência e da racionalidade administrativa. Entende-se por “entrega imediata” aquela que ocorrer em até trinta dias a partir do pedido formal de fornecimento feito pela Administração, que deve ocorrer por meio da emissão da nota de empenho, desde que a proposta esteja válida na ocasião da solicitação.
Acórdão 7192/2016-Primeira Câmara1.7. Dar ciência à [omissis] de que locação verbal é considerada falha de natureza formal (Acórdão 3472/2014-TCU-Plenário) que pode ensejar a aplicação de sanções aos gestores responsáveis, segundo Acórdão 1227/2012-TCU-Plenário, 891/2010-TCU-Plenário e 2.515/2009-TCU-Plenário, e que o fato de a ECT reconhecer dívidas sem cobertura contratual, não obsta a apuração de responsabilidade de quem deu causa à referida despesa, conforme estabelecem os Acórdão 2279/2009-TCU-Plenário e 375/1999-TCU-2ª Câmara.
Acórdão 3352/2015-TCU-Plenário[Relatório] 7.11. O Tribunal tem manifestações nos dois sentidos, mas mantém jurisprudência sistematizada com entendimento de que a contratação deve ser formalizada obrigatoriamente por meio de termo de contrato sempre que houver obrigações futuras decorrentes do fornecimento de bens e serviços, independentemente da modalidade de licitação, sua dispensa ou inexigibilidade, conforme preconizado no art. 62, § 4º, da Lei 8.666/1993;
Acórdão 874/2015-Segunda Câmara1.8. Dar ciência à [omissis] sobre as seguintes ocorrências consignadas no Relatório de Auditoria de Gestão 201203181, da Controladoria-Geral da União: […] 1.8.3. prestação de serviço antes da conclusão de procedimento licitatório e da emissão de empenho – contrato verbal no valor de R$ 37.640,00 (trinta e sete mil, seiscentos e quarenta reais);
Acórdão 2504/2014-TCU-Plenário[Enunciado] É nulo qualquer ajuste verbal entre a Administração e o contratado para promover alterações qualitativas ou quantitativas ocorridas durante a execução do objeto.
Acórdão 2380/2013-TCU-Plenário[Enunciado] Nos termos dos arts. 60, parágrafo único, e 62 da Lei 8.666/1993, a execução de serviços sem a formalização de termo contratual caracteriza contrato verbal, ainda que o pagamento seja realizado após a assinatura do contrato.
Acórdão 1227/2012-TCU-Plenário[Enunciado] Alterações contratuais sem a devida formalização mediante termo aditivo configura contrato verbal, que pode levar à apenação dos gestores omissos quanto ao cumprimento do dever.
Acórdão 5820/2011-Segunda Câmara9.6.2. irregularidade constatada no âmbito do Contrato nº 2/08/027, firmado em 18/12/2008, consistente na aquisição de bens ou serviços sem cobertura de termo contratual, bem assim sua celebração com cláusula de vigência retroativa, caracterizando a existência de contrato verbal antes de sua formalização, decorrente do descumprimento do parágrafo único do art. 60 da Lei nº 8.666, de 1993;
Acórdão 423/2011-TCU-Plenário9.2. alertar ao [omissis] para que, em suas futuras licitações e contratações, abstenha-se de: […] 9.2.4. autorizar a prestação de serviços sem formalizar o devido termo de contrato, infringindo o disposto nos artigos 38, inciso X, 60 e 62 da Lei 8.666/93; e   [Relatório] 15. Não se trata de simples formalidade. Em verdade, a formalização dos contratos no âmbito do poder público, pela administração direta ou indireta, assegura a publicidade do ato, e vias de consequência, a transparência e a lisura do negócio. Há que se considerar também que a assinatura do contrato dificulta, sobremaneira, o desvio de recursos e torna difícil a prática das mais diversas ilicitudes. Em síntese, a ausência de contrato escrito, sem dúvida, é fonte de desvio e desmando e não favorece nem ao contratante nem ao contratado. Por isso mesmo, a Lei fulmina como absolutamente nula avença dessa natureza e nem mesmo reconhece a boa-fé das partes envolvidas.’ (Grifo nosso)
Acórdão 1219/2007-Primeira Câmara[Enunciado] O termo de contrato deve ser formalizado sempre que houver obrigações futuras decorrentes do fornecimento de bens e serviços, independentemente da modalidade de licitação.
Pesquisa de JurisprudênciaExecute consulta na Jurisprudência Selecionada. Pesquise pela árvore de classificação: área “contrato administrativo”. Os resultados podem ser filtrados pelos temas: “contrato verbal”; “formalização do contrato”;

Fonte: Elaboração própria a partir de consulta a jurisprudência do TCU.

Quadro 368 – Riscos relacionados

Riscos
Atraso no procedimento licitatório somada à essencialidade do objeto licitado, levando à formalização do contrato por meio de nota de empenho, com consequentes ilegalidade por afronta ao art. 95 da Lei 14.133/2021, prejuízo à transparência da contratação, e dificuldade ou impossibilidade de obter de forma satisfatória o objeto contratado. 
Não utilização de minutas de contrato padronizadas, levando à multiplicidade de esforços para realizar contratações semelhantes e repetição de erros (p. ex., celebrar contratos sem todas as cláusulas necessárias), com consequentes desperdício de recursos e problemas na execução contratual.
Utilização de minutas de contrato padronizadas para contratações peculiares, sem adequar o instrumento às especificidades do caso concreto, levando a falhas ou omissões na definição das cláusulas contratuais, e a divergências de entendimento e expectativas entre as partes, com consequentes conflitos com o contratado durante a execução contratual e atrasos e falhas na prestação dos serviços ou nos fornecimentos.

Fonte: Elaboração própria.

Quadro 369 – Modelos

AssuntoModelo disponibilizados por OGS ou por órgãos de controleOGS
Minutas padronizadasModelos de licitações e contratos para a Lei 14.133/2021 (Advocacia-Geral da União; Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, 2023)AGU MGI
Orientações para Contratação de TIC (Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos em Serviços Públicos, 2023)MGI
DiretrizesInstrumento de Padronização dos Procedimentos de Contratação (Advocacia-Geral da União; Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos em Serviços Públicos, 2023b)AGU, MGI

Fonte: Elaboração própria.


[1] Lei 8.666/1993, art. 2º, parágrafo único. Ainda que constante de lei pretérita, o conceito é aplicável aos contratos regidos pela Lei 14.133/2021.

[2] Lei 14.133/2021, art. 104.

[3] Lei 14.133/2021, art. 89, caput.

[4] Lei 14.133/2021, art. 89, § 2º.

[5] Lei 14.133/2021, art. 95, caput e incisos I e II.

[6] Lei 14.133/2021, art. 6º, inciso X.

[7] Lei 14.133/2021, art. 95, § 1º.

[8] Advocacia-Geral da União; Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos em Serviços Públicos, 2023, p. 73.

[9] Lei 14.133/2021, art. 91, caput e § 3º.

[10] Lei 14.133/2021, art. 95, § 2º.

[11] Valor atualizado anualmente por decreto do Poder Executivo federal. Vide Decreto 11.871/2023, anexo.

[12] Lei 14.133/2021, art. 91, § 2º.

[13] Lei 14.133/2021, art. 190, art. 191, caput e parágrafo único.

[14] Lei 14.133/2021, art. 25, § 1º.

[15] Lei 14.133/2021, art. 19, inciso IV e § 2º.