Licitações e Contratos: Orientações e Jurisprudência do TCU Licitações e Contratos

4.1.8. Justificativas para o parcelamento ou não da contratação

O parcelamento consiste em dividir a solução em itens ou os itens em lotes, em que cada parte será um objeto de licitação autônomo, a ser, portanto, licitado ou adjudicado separadamente[1].

O objetivo do parcelamento é ampliar a competição com vistas à economicidade, devendo ser realizado desde que seja tecnicamente viável e economicamente vantajoso[2].

A expectativa é possibilitar a participação de maior número de licitantes que não teriam capacidade ou condições de atender aos requisitos de habilitação para disputar a totalidade do objeto, mas que podem fazê-lo com relação a frações da prestação. Supõe-se que a ampliação da disputa levará os participantes a apresentarem propostas mais vantajosas, resultando na redução do valor global a ser desembolsado pela Administração e evitando a concentração de mercado[3].

Se a solução for divisível, a equipe de planejamento deve analisar a viabilidade técnica e a vantajosidade econômica do parcelamento para fins de contratação, e fundamentar a decisão no ETP[4]. Cabe lembrar que os requisitos de habilitação devem ser adequados e proporcionais aos itens, grupos ou lotes resultantes do parcelamento. Assim, os licitantes podem habilitar-se para uma ou mais partes licitadas.

Existem situações em que o parcelamento pode ser inviável ou desvantajoso. Por exemplo, quando há perda de economia de escala e a divisão em mais de um certame resulta em aumento dos custos globais da contratação. Outra situação é quando os benefícios do parcelamento não compensam o aumento do custo e das dificuldades administrativas da gestão contratual. Além disso, o parcelamento pode descaracterizar ou prejudicar o objeto da contratação, ou ser necessário contratar um fornecedor único para padronização. Especificamente para serviços, o parcelamento pode levar à perda da responsabilidade técnica devido à pluralidade de prestadores[5].

No caso de obras e serviços de engenharia, também existe o risco relacionado à responsabilidade técnica de cada uma das parcelas a serem contratadas, bem como à necessidade de que cada etapa realizada tenha funcionalidade autônoma. Essa condição deve ser ponderada na definição da estratégia de contratação. Um exemplo não recomendável de parcelamento, exatamente pela dificuldade de gestão das responsabilidades, é contratar as fundações de uma edificação em separado do restante da estrutura. Além de a fundação, contratada isoladamente, não ter serventia plena, há o risco de paralisação posterior de serviços, degradação das etapas já realizadas e vícios aparentes ou ocultos na parcela executada.

Quadro 109 – Referências normativas para o parcelamento

NormativosDispositivos
Lei 14.133/2021Art. 18 § 1º O estudo técnico preliminar a que se refere o inciso I do caput deste artigo deverá evidenciar o problema a ser resolvido e a sua melhor solução, de modo a permitir a avaliação da viabilidade técnica e econômica da contratação, e conterá os seguintes elementos: […] VIII – justificativas para o parcelamento ou não da contratação; Art. 40. O planejamento de compras deverá considerar a expectativa de consumo anual e observar o seguinte: […] V – atendimento aos princípios: […] b) do parcelamento, quando for tecnicamente viável e economicamente vantajoso; […] § 2º Na aplicação do princípio do parcelamento, referente às compras, deverão ser considerados: I – a viabilidade da divisão do objeto em lotes; II – o aproveitamento das peculiaridades do mercado local, com vistas à economicidade, sempre que possível, desde que atendidos os parâmetros de qualidade; e III – o dever de buscar a ampliação da competição e de evitar a concentração de mercado. § 3º O parcelamento não será adotado quando: I – a economia de escala, a redução de custos de gestão de contratos ou a maior vantagem na contratação recomendar a compra do item do mesmo fornecedor; II – o objeto a ser contratado configurar sistema único e integrado e houver a possibilidade de risco ao conjunto do objeto pretendido; III – o processo de padronização ou de escolha de marca levar a fornecedor exclusivo. Art. 47. As licitações de serviços atenderão aos princípios: […] II – do parcelamento, quando for tecnicamente viável e economicamente vantajoso. § 1º Na aplicação do princípio do parcelamento deverão ser considerados: I – a responsabilidade técnica; II – o custo para a Administração de vários contratos frente às vantagens da redução de custos, com divisão do objeto em itens; […] III – o dever de buscar a ampliação da competição e de evitar a concentração de mercado. Art. 82. O edital de licitação para registro de preços observará as regras gerais desta Lei e deverá dispor sobre: […] II – a quantidade mínima a ser cotada de unidades de bens ou, no caso de serviços, de unidades de medida; […] § 1º O critério de julgamento de menor preço por grupo de itens somente poderá ser adotado quando for demonstrada a inviabilidade de se promover a adjudicação por item e for evidenciada a sua vantagem técnica e econômica, e o critério de aceitabilidade de preços unitários máximos deverá ser indicado no edital.
Lei Complementar 123/2006Art. 48.  Para o cumprimento do disposto no art. 47 desta Lei Complementar, a Administração Pública: (Redação dada pela Lei Complementar nº 147, de 2014)  (Vide Lei nº 14.133, de 2021 […] III – deverá estabelecer, em certames para aquisição de bens de natureza divisível, cota de até 25% (vinte e cinco por cento) do objeto para a contratação de microempresas e empresas de pequeno porte. Art. 49. Não se aplica o disposto nos arts. 47 e 48 desta Lei Complementar quando: (Vide Lei nº 14.133, de 2021 […] II – não houver um mínimo de 3 (três) fornecedores competitivos enquadrados como microempresas ou empresas de pequeno porte sediados local ou regionalmente e capazes de cumprir as exigências estabelecidas no instrumento convocatório; III – o tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte não for vantajoso para a Administração Pública ou representar prejuízo ao conjunto ou complexo do objeto a ser contratado; […] IV – a licitação for dispensável ou inexigível, nos termos dos arts. 24 e 25 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993, excetuando-se as dispensas tratadas pelos incisos I e II do art. 24 da mesma Lei, nas quais a compra deverá ser feita preferencialmente de microempresas e empresas de pequeno porte, aplicando-se o disposto no inciso I do art. 48. (Redação dada pela Lei Complementar nº 147, de 2014).
IN – SGD/ME 94/2022Art. 12. O Termo de referência ou Projeto básico será elaborado pela Equipe de Planejamento da Contratação a partir do Estudo Técnico Preliminar da Contratação, incluindo, no mínimo, as seguintes informações: […] § 2º A Equipe de Planejamento da Contratação avaliará a viabilidade de: I – realizar o parcelamento da solução de TIC a ser contratada, em tantos itens quanto se comprovarem tecnicamente viável e economicamente vantajoso, observado o disposto nos §§ 2º e 3º do art. 40 e § 1º do art. 47 da Lei nº 14.133, de 2021, justificando-se a decisão de parcelamento ou não da solução; e II – permitir consórcio ou subcontratação da solução de TIC, observado o disposto nos arts. 15 e 122 da Lei nº 14.133, de 2021, justificando-se a decisão. § 3º A Equipe de Planejamento da Contratação avaliará, ainda, a necessidade de licitações e contratações separadas para os itens que, devido a sua natureza, possam ser divididos em tantas parcelas quantas se comprovarem tecnicamente viável e economicamente vantajoso, procedendo-se à licitação com vistas ao melhor aproveitamento dos recursos disponíveis no mercado e à ampliação da competitividade sem perda da economia de escala, conforme disposto no § 2º do art. 40, e inciso II do art. 47, da Lei nº 14.133, de 2021. […]
IN – Seges 58/2022Art. 9º Com base no Plano de Contratações Anual, deverão ser registrados no Sistema ETP Digital os seguintes elementos: […] VII – justificativas para o parcelamento ou não da solução; […]

Fonte: Elaboração própria com base nas normas consultadas.

Quadro 110 – Jurisprudência do TCU

JulgadosDispositivos
Súmula – TCU 247É obrigatória a admissão da adjudicação por item e não por preço global, nos editais das licitações para a contratação de obras, serviços, compras e alienações, cujo objeto seja divisível, desde que não haja prejuízo para o conjunto ou complexo ou perda de economia de escala, tendo em vista o objetivo de propiciar a ampla participação de licitantes que, embora não dispondo de capacidade para a execução, fornecimento ou aquisição da totalidade do objeto, possam fazê-lo com relação a itens ou unidades autônomas, devendo as exigências de habilitação adequar-se a essa divisibilidade.
Acórdão 791/2024-TCU-Plenárioc) dar ciência ao [omissis], com fundamento no art. 9º, inciso I, da Resolução TCU 315/2020, sobre as seguintes impropriedades/falhas, identificadas no Pregão Eletrônico 90001/2024, para que sejam adotadas medidas internas com vistas à prevenção de outras ocorrências semelhantes:   c.1) previsão, no item 5.2 do termo de referência, da vedação à subcontratação, sem justificativas nos estudos técnicos preliminares da contratação, considerando a natureza do objeto e a alegação da unidade jurisdicionada de que seria possível a subcontratação de partes acessórias do objeto, em desconformidade com o art. 9º, inciso I, alínea “a”, da Lei 14.133/2021 e com a jurisprudência do Tribunal, a exemplo dos Acórdão 3144/2011-TCU-Plenário, relator Ministro Aroldo Cedraz, e 1.235/2021-TCU-Plenário, relator Ministro Augusto Sherman; c.2) ausência de justificativas adequadas no estudo técnico preliminar da contratação quanto à inviabilidade técnica ou econômica do não parcelamento do objeto, contrariando a Súmula TCU 247 e os arts. 18, § 1º, inciso VIII, e 47, inciso II, da Lei 14.133/2021;
Acórdão 718/2024-TCU-Plenárioc) dar ciência à [omissis], com fundamento no art. 9º, inciso I, da Resolução – TCU 315/2020, sobre a seguinte impropriedade e/ou falha identificada no Pregão Eletrônico 4/2023, para que sejam adotadas medidas internas com vistas à prevenção de outras ocorrências semelhantes: […] c.1) parcelamento da licitação associada ao julgamento por item, quando tal situação era inviável, em afronta ao art. 23, § 1º, da Lei 8.666/1993, ao art. 47, inc. II, da Lei 14.133/2021 e à Súmula – TCU 247;
Acórdão 2529/2021-TCU-Plenário[Enunciado] Incumbe ao gestor demonstrar que a ausência de parcelamento do objeto da licitação não restringe indevidamente a competitividade do certame, bem como promove ganhos para a Administração Pública. O postulado que veda a restrição da competitividade (art. 3º, § 1º, inciso I, da Lei 8.666/1993) não é um fim em si mesmo, devendo ser observado igualmente o princípio constitucional da eficiência administrativa (art. 37, caput, da Constituição Federal) e, ainda, o ganho de escala nas contratações consolidadas (art. 23, § 1º, in fine, da Lei 8.666/1993).
Acórdão 1845/2018-TCU-Plenário[Voto] 12. Em essência, tanto no caso do [omissis], anulado em face do aludido Acórdão 9873/2017-TCU-Segunda Câmara, quanto no caso do [omissis], lançado em substituição ao referido certame, a irregularidade residiria na ausência de parcelamento do objeto, em descompasso com o art. 23, § 1º, da Lei nº 8.666, de 1993, e com a Súmula nº 247 do TCU. 13. Ocorre, todavia, que, diferentemente do primeiro caso, quando a Superintendência do [omissis] não teria comprovado a suposta economicidade pela contratação unitária, o presente caso concreto contaria com os elementos suficientes para comprovar a adequação do parcelamento do objeto em 4 polos. 14. Bem se sabe que, à luz do referido art. 23, § 1º, da Lei nº 8.666, de 1993, e da Súmula nº 247 do TCU, a obrigatoriedade do parcelamento respeitaria os limites de ordem técnica e econômica, salientando que o fundamento para o aludido parcelamento consistiria na ampliação das vantagens para a Administração Pública, de sorte que não se exigiria o parcelamento do objeto, quando tecnicamente inviável ou não recomendável ou, mesmo, quando resulte em aumento dos custos. 15. Pelo prisma técnico, a Secex-SP aduziu que o correspondente modelo de gestão contratual traria benefícios ao gerenciamento do objeto contratado na medida em que as atividades de gestão contratual seriam realizadas por servidores mais capacitados e lotados no Centro de Serviços Compartilhados (CSC), sem prejuízo da fiscalização dos serviços sob responsabilidade de fiscais locais lotados nas respectivas agências e gerências executivas do [omissis]. 16. Já pelo prisma econômico, a Secex-SP anotou que a análise comparativa entre o contrato atualmente firmado pela [omissis] com o [omissis], para a parcela do item 1 do [omissis], e o contrato resultante dessa nova licitação, segundo o modelo proposto pelo [omissis], apontaria para a significativa redução nos valores do subsequente contrato. 17. Nesse ponto, a unidade técnica observou que a Superintendência do [omissis] também fez essa comparação, para o objeto total do [omissis], tendo sinalizado para a obtenção de economia anual na ordem de R$ 534.258,48 sobre o valor global dos contratos.
Acórdão 2796/2013-TCU-Plenário[Voto] 9. Urge frisar, preliminarmente, que a adjudicação por grupo ou lote não pode ser tida, em princípio, como irregular. É cediço que a Súmula nº 247 do TCU estabelece que as compras devam ser realizadas por item e não por preço global, sempre que não haja prejuízo para o conjunto ou perda da economia de escala. Mas a perspectiva de administrar inúmeros contratos por um corpo de servidores reduzido pode se enquadrar, em nossa visão, na exceção prevista na Súmula nº 247, de que haveria prejuízo para o conjunto dos bens a serem adquiridos. 10. A Administração deve sopesar, no caso concreto, as consequências da multiplicação de contratos que poderiam estar resumidos em um só, optando, então, de acordo com suas necessidades administrativas e operacionais, pelo gerenciamento de um só contrato com todos os itens ou de um para cada fornecedor. É claro que essa possibilidade deve ser exercida dentro de padrões mínimos de proporcionalidade e de razoabilidade.
Acórdão 1214/2013-TCU-Plenário9.1.16 deve ser evitado o parcelamento de serviços não especializados, a exemplo de limpeza, copeiragem, garçom, sendo objeto de parcelamento os serviços em que reste comprovado que as empresas atuam no mercado de forma segmentada por especialização, a exemplo de manutenção predial, ar condicionado, telefonia, serviços de engenharia em geral, áudio e vídeo, informática; […]
Acórdão 2907/2012-TCU-Plenário[Voto] 25. Sem embargo, veja-se que o [omissis] deseja contratar serviços inteiramente afins e interligados, que vão desde o planejamento até a avaliação dos eventos, com ápice na sua execução. 26. Para o bom funcionamento do serviço como um todo, não é sensata a ideia de fragmentá-lo entre dezenas de contratos desconexos, cujas empresas responsáveis precisarão se reunir, por ocasião de cada evento, sem que haja coordenação e supervisão, uma delas para cuidar do transporte, outra da recepção, outra da segurança, outra da tradução, outra da decoração, outra do cerimonial, outra da sonorização, outra da obtenção do espaço, outra da disponibilização do mobiliário, outra para fornecimento de materiais e equipamentos, e por aí vai, conforme descrito no detalhamento do objeto licitado. Fora as atividades que devem ser desenvolvidas antes e depois dos eventos. (Grifo nosso)
 Acórdão 5260/2011-TCU-Primeira Câmara[Enunciado] É cabível a divisão do objeto a ser licitado em grupos compostos por itens de mesma natureza.
 Acórdão 1695/2011-TCU-Plenário[Enunciado] A decisão do administrador em não parcelar uma contratação deve ser obrigatoriamente precedida de estudos técnicos que a justifiquem.
Pesquisa de JurisprudênciaExecute consulta na Jurisprudência selecionada por árvore de classificação: área “Licitação” e tema “Parcelamento do objeto”.

Fonte: Elaboração própria com base na jurisprudência do TCU.

Quadro 111 – Riscos relacionados

Riscos
Não parcelamento de solução de natureza divisível, levando à diminuição da competição na licitação, com consequente perda de oportunidade de reduzir os valores a serem desembolsados pela Administração ou contratação com sobrepreço e superfaturamento decorrente.
Parcelamento de solução de natureza não divisível, levando à contratação de solução incompleta, com consequentes atrasos no atendimento da necessidade da Administração até que as partes faltantes sejam contratadas, interrupção de serviços e atividades, ou mesmo a perda do investimento realizado.
Parcelamento excessivo da solução, levando ao desinteresse do mercado em competir por parcelas fracionadas em excesso, pois tais parcelas, isoladamente, são economicamente pouco atrativas aos potenciais fornecedores, com consequente adjudicação somente dos itens maiores.
Falha na análise quanto à vantajosidade econômica do parcelamento, levando a múltiplas contratações, com consequente soma dos valores unitários dessas contratações que supere o valor global que a Administração pagaria a um único fornecedor (perda de economia de escala).
Falha na análise quanto à vantajosidade técnica do parcelamento, levando a múltiplas contratações com diferentes fornecedores, com consequente ampliação dos custos de gestão contratual de modo a superar os benefícios advindos do parcelamento.
Falha na análise quanto à viabilidade técnica do parcelamento de serviço, levando ao comprometimento da responsabilidade técnica, tendo em vista a pluralidade de prestadores envolvidos, com consequentes interrupções na execução do objeto e conflitos entre a Administração e os prestadores e entre eles.

Fonte: Elaboração própria.


[1] Tribunal de Contas da União, 2012, p. 101-106, Tribunal de Contas da União, 2010, p. 238-239, Torres, 2021, p. 230.

[2] Lei 14.133/2021, art. 40, inciso V, alínea “b”; e art. 47, inciso II.

[3] Lei 14.133/2021, art. 40, § 2º, inciso III, e art. 47, § 1º, inciso III.

[4] Lei 14.133/2021, art. 18, § 1º, inciso VIII.

[5] Lei 14.133/2021, art. 40, § 3º, incisos I a III, e art. 47, § 1º, incisos I e II.